-já estou indo, pera ai. - respondeu a jovem garçonete limpando os farelos de pão da mesa 5 ainda que um garotinha tinha deixado.
Foi até o balcão e jogou o paninho na pia e pegou a jarra de café, limpando a outra mão no avental.
-café? - ofereceu chegando a mesa 3.
-Obrigada querida! - respondeu a fiel cliente.
Alisson sorriu.
-Esta sabendo da novidade querida? - perguntou a cliente, com os olhos brilhando e fixos em Alisson. -O que? Vou finalmente ganhar uma gorjeta? - disse ironicamente ela para cliente, com os olhos brilhando também.
-Melhor que isso sua tolinha! Fiquei sabendo que o proximo navio de carga vem trazendo algo de valor de verdade! - disse a cliente baixando a xícara de café e dando um tapinha na perna dela.
-Dona Steffane, continua saindo com esses marinheiros babões?
Dona Steffane ruborizou.
-Ora Alisson, a carne é fraca! Sabe que músculos, uniforme e cerveja me deixam doidinha.
Alisson rio e balançou a cabeça.
-Enfim! Fiquei sabendo que eles irão até uma ilha longínqua a pedido de um rei buscar seus filhos que estão fugindo, e virão pra cá, esse pais esquecido pelo Criador. - disse tomando um gole do café fumegante.
Alisson torceu a face com confusão e desgosto. Não havia nada que mais quisesse com tanta força do que ir embora daquele lugar.
-Para fazer o que aqui?
-Ninguem sabe! Só estão cumprindo ordens, até porque, a bufunfa vai ser das grandes. Pode ser sua chance querida. - Steffane deu mais um tapinha na perna.
-De que?
-De conseguir um namoro bom pra vc, e melhor ainda, um principe. - os olhos de Steffane brilharam. Dona Steffane foi baba de Alisson quando era pequena, quando seus pais se separaram e seu pai sempre tinha rondas noturnas para fazer como vigia do bairro.
-Vc sempre querendo me casar com alguém. Sabe que não ligo para isso agora, quero só sair daqui e correr pro Inglaterra para fazer meu intercâmbio.
Ela sempre teve vontade de estudar fora, mas quando sua familia de desmantelou e deixou de ser 'fácil de lidar' como qualquer familia Sul Americana, correr daquele lugar virou a prioridade de sua vida.
-Claro minha querida! Mas com essa piada de salário que recebe aqui nunca conseguirá, mas nada que uma coroa cravejada de diamantes não resolva, não é? - ela deu uma piscadela para Alisson que riu e concordou com a cabeça.
-E ela lá faz por merecer? Vamos Alisson! Mesa 7 está chamando. - disse Alexandre, dono do estabelecimento que a chamou por cima do balcão.
-Cadê a Amanda? Ela tá sempre em pausa é? - disse Alisson dando uma piscadinha para Steffane e indo até a mesa.
-Não reclame! Essa piada de salário é o que eu posso te pagar por ser tão molenga. - disse ele, limpando os copos na pia, bufando.
Alexandre não era uma pessoa ruim, na verdade, Alisson gostava muito dele e ele cuidava muito bem dela, do jeito rabugento dele, mas cuidava.
-Voce vai trancar aqui Amanda? - gritou Alisson no final do expediente.
-Pode deixar, eu vou trancar, vai embora logo. - resmungou Amanda, puxando mais um trago no cigarro.
-Então tchau! - correu ela para fora da loja, vestindo o casaco e jogando a mochila nas costas, finalmente a caminho de casa.
O ar saia pela boca resfriado. O inverno estava realmente pegando pesado esse ano, o que era raro em um pais equatorial.
Alisson chegou em casa o mais rápido que pode e jogou a mochila no chão e foi direto pro sofá.
-Pai? - gritou, mas não teve resposta. -hmm… deve estar na ronda dele já.
O pai dela era aposentado já, devido a um acidente de trabalho nas pernas, o que o fez ficar muito tempo na reabilitação. Com todo o dinheiro gasto, com todas as depressões, privações e afins, a mãe da garota não aguentou e se mandou de um dia para o outro, deixando eles a se virarem.
E foi o que fizeram por muito tempo. Alisson teve que mudar de escola, tiveram que vender a casa e mudaram para um apartamento menor, mas eles se viraram.
Com muita preguiça subia para seu quarto e arrumou suas coisas para o dia seguinte, e com a janela aberta, podia ver o porto com o mar calmo, a luz da lua brilhando azulada tremeluzindo e navios, cordas, contenders e pequenas luzes amarelas dos marinheiros com seus lampiões em rodas.
Allison sorriu ao pensar: príncipe… até parece! Ainda existe algum lugar que a realeza tenha que fugir para se salvar? Que piada Steffane.
Mas em um daqueles contenders pela janela, grande e frio, havia a realeza fugitiva, que tremia, sujos e com medo, respirando pausadamente para não serem ouvidos, abraçados, irmão e irmã, rezando para não serem traídos por aquelas pessoas que seu pai arranjou para os levarem para longe enquanto tudo desmoronava léguas atrás deles.
-E se morrermos aqui Peter? - diste a garota, a boca mal mexendo, e os olhos cheios de lagrimas.
-Vai dar tudo certo Lucy, é só por enquanto, logo estaremos em casa. - respondeu o irmão, tentando sorrir e retirando aquele luz quase inexistente de esperança que tinha, para acalmar a irmã, mas ele mesmo não acreditava em suas palavras.
As portas enferrujadas do contender sacudiram quando pousaram no chão e os irmãos caíram para o lado pelo impacto. As portas rangeram ao se abrirem e dois homens altos, adultos e com lanternas os chamaram baixinho pelo nome.
-Estamos aqui. - sussurrou Peter, ajudando a irmã a se levantar.
-Venham conosco, temos que correr, um carro nos espera.
Peter ergueu a irmã que foi correndo ao encontro do homem, quando ele a segurou pelo braço.
-Quem são vcs? Como saberemos se são os homens que nosso pai contratou? - perguntou serio e Lucy, recuando devagar, ficou ao lado do irmão.
-Não temos tempo para isso moleque, vamos logo. - disse um dos homens que era mais rechonchudo e parecia de saco cheio de todo o procedimento de segurança.
-Aqui olha. - o mais barbudo retirou uma moeda dourada do bolso. - é a moeda do seu pais não é? - disse estendendo a moeda para eles, não se aproximando.
Peter verificou a moeda e viu talhado no metal precioso a foto de seu tatara tatara tatara tatara tatara tatara avô. Fez sinal para Lucy e ambos saíram correndo do contender e seguiram os homens até um carro preto que estava perto do cais.
O carro estava quente e macio, e Lucy se aninhou em seu irmão, para aquecer mais rápido, e logo caiu no sono, já que nenhum dos dois havia conseguido dormir na viagem.
-Calma! Vamos levar vcs para um lugar seguro. - disse o rechonchudo, que vendo os irmãos assim, tão indefesos, sujos e cansados, teve empatia por eles. -Durmam um pouco, teremos que ir até o outro lado da cidade.
Peter queria ter conseguido ficar acordado, para ver a cidade, ver como eram as pessoas e quanto seria difícil de adaptar, mas logo que o carro começou com sua sacudida leve, o rádio baixinho com uma musica tranquila, deixou-se cair no sono.
No cais, alguns momentos depois dos irmãos serem levados, uma figura negra saiu do canto escuto do mesmo contender, se arrastando como se estivesse machucado, e sumiu por entre os barcos, cordas e pequenas luzes dos lampiões dos marinheiros e como se nenhum mal estivesse para acontecer.
-by Elize Blackmore
(inspirado em um sonho)