terça-feira, 5 de novembro de 2013

Won't give up

Meus pais confiavam nele. Acho que foi essa a estratégia dele desde o inicio, trapacear com a confiança.
Fui sequestrada juntamente com duas primas e com mais um garoto, que não conhecia exatamente, mas me era familiar.
Eu não estava entendendo nada: não eramos uma família de dinheiro ou posses, então porque Não estávamos depondo em algum tribunal contra alguém importante, não estávamos fazendo nada, nada de anormal, então porque esse homem entrou em na minha casa, trabalhou pro meu pai, fez ele ter confiança nele, para depois nos manter em cativeiro dentro de uma casa longe e mal acaba, pequena e com cheiro de gesso?
Eu estava sentada em cima de um jornal sujo e velho e minhas primas choravam de desespero pela imagem do homem familiar, mas agora equipado com uma forte metralhadora grande e preta.
Ele não se comunicava com ninguém por walk-talk ou nextel, que seja, ele não tinha telefones para confirmar a missão, ele não entrou em contato com meus pais, nada! Ele não fez nada, apenas nos manteve em cativeiro e nos observou com a arma na mão com um ar tenso a todo o momento.
Eu o encarava sem vacilar, estava assustada e minha cabeça apenas mandava o sinal de sempre olha-lo para vigiar e assim impedir que ele fizesse algum mal a nós.
Ele encontrou meu olhar várias vezes e me encarava com um ar de indiferença e terror ao mesmo tempo, e eu simplesmente sabia que aquele homem não era mais o que havia frequentado minha casa ou trabalhado com meu pai, eu tive a certeza de que aquilo, aquilo lá dentro, era outra coisa.
Um pensamento me veio como um raio na mente: Se ele não se comunica com ninguém, pode ser que isso não seja um grupo, quadrilha, o qualquer outra coisa, mas que ele esteja agindo sozinho... e isso sinceramente, facilitaria a ideia de escapar dali, já que ele não teria nenhuma ajuda, e mesmo desarmados, estávamos em maior numero.
Não sei se pareceu a ele que eu arquitetava um plano, ou no minimo tinha chegado a conclusão de que ele estava sozinho, mas assim que esse pensamento passou pela minha mente e ele novamente cruzou seu olhar comigo, ele ergueu a metralhadora para o teto e o metralhou com fúria.
Minhas primas gritaram e o garoto se protegeu dos destroços que vieram abaixo.
Eu fiquei imóvel.
Aquilo era uma mensagem bem clara e barulhenta.
Ele não disse nada, apenas me olhou novamente e ficou andando de um lado pro outro pelo comodo, que eu presumi que fosse uma sala, pelo que restava de um sofá, um acesso para o andar de cima pela escada, e um corredor curto que levava para outro comodo que eu não sabia qual.
Eu comecei a tremer freneticamente, mas tentei me conter, não queria que ele visse que eu estava com medo. Aquele silencio e aqueles momentos iriam durar para sempre se não fizéssemos alguma coisa, pois ele não estava com cara de que sairia dali, a não ser algemado, por alguma policia que nem fazia ideia do nosso sumiço.
Minhas primas estavam abraçadas uma na outra, e chorando bastante, e tinha certeza que não poderia contar com alguma reação delas, então olhei para o garoto alto que parecia ter minha idade, que limpava os destroços da roupa. Depois de alguns segundos, ele me olhou também e tentei ao máximo demonstrar o que estava pensando para ele telepaticamente. Mexia os olhos repetidamente para demonstrar o plano: Ele derrubaria o homem no chão (ele era magro, mas pelo menos era homem), e eu correria desesperadamente para os outros cômodos. Claramente, o sequestrador iria atrás de mim para não me deixar escapar, e como agia sozinho, eles ficaram na sala, então poderiam correr e pedir ajuda, e se não corresse atrás de mim, eu seria a que iria pedir ajuda. Se alguém ia morrer... bem, eu preferir pular essa parte da telepatia.
Com o meu sinal ocular ele pareceu entender que eu queria que ele o derruba-se apenas, e que o resto ele descobriria assim que fizesse isso, pois acredito que ele também percebeu que aquilo seria para sempre se não fizéssemos algo.
E então ele agiu.
Esperou com que o homem armado virasse para o meu lado que era o oposto do dele e se jogou em cima dele com todo o peso. A surpresa fez o homem ir ao chão imediatamente, sem ter no que se segurar. Eu imediatamente me levantei e corri pelo pequeno correr, até passar pela porta sanfonada e chegar no comodo seguinte que eu identifiquei como a cozinha.
As coisas aconteceram rápido demais.
Encontrei outras armas em cima da mesa da cozinha, umas 3 outras metralhadoras carregadas, e assim que as vi, peguei uma delas e encaixei no corpo e voltei correndo para a sala. Ele chutava o garoto estirado no chão, e assim que se virou para me olhar, eu sem pensar duas vezes, disparei a metralhadora no peito dele.
Ele foi ao caiu no chão, cheio de furos, e eu soltei aquela arma quase tão rápido quanto a peguei.
'Eu matei uma pessoa, eu matei uma pessoa, eu matei uma pessoa...' era o único pensamento que cortava minha mente e um desespero subia forte em forma de lágrimas nos meus olhos arregalados.
'Ele esta morto' uma de minhas primas me disse ao olha-lo esparramado na sala, com sangue escorrendo.
O garoto se recompunha dos chutes e minha outra prima o ajudou a se levantar.
Eu tomei todo o folego que consegui e voltei a cozinha. Ali havia uma porta, e eu tinha que ver se estava aberta, tinha que nos tirar dali pra depois pensar no que eu tinha feito.
Eu apenas girei a maçaneta e a porta velha se abriu em um ranger forte. Olhei pela fresta para ver se realmente estávamos sozinhos e avistei uma maquina de lavar cheia de ferrugem e um quintal pequeno, circundado por um muro branco que dividia a casa de um matagal fechado. Abrindo a porta e saindo com cautela, pude ver que a porta da sala que estávamos ficava no mesmo corredor que a da cozinha e um pouquinho a frente, um portão velho e entre aberto, assinando nossa liberdade e nossa volta pra casa.
'vamos, podemos ir por aqui' eu falei alto para minhas primas e o garoto ouvirem, e sai para o quintal, andando rápido com sede de liberdade.
'NÃO, NÃO SAI POR AI' a voz estridente de uma de minhas primas soou pela grande janela com grades que ficava entre ambas as portas.
A porta da sala se abriu com um estrondo e o homem, sangrando com a arma em punho, estava novamente em pé, vivo e com a metralhadora a 10 metros de mim.
Ao invés de voltar ou correr, eu coloquei os braços fechados na frente do peito e do rosto, e assim eu protegi minhas partes letais quando ele disparou as pesadas balas em mim.

Assim que os disparos pararam, o garoto o puxou pela blusa para trás e ele caiu como um boneco, batendo a cabeça forte e apagando, quem sabe de vez.
Eu não estava morta.
O impacto dos tiros haviam me jogado para trás quase de volta a porta. Estava no chão, felizmente os tiros realmente não passaram perto do meu coração ou cérebro, e nem atingiram nenhuma parte letal, mas furaram meu ombro e perfuraram quase que todo o meu braço. Eu sangrava desenfreadamente e não conseguia me mexer. O grito foi engolido pela minha dor lancinante, que sufocava minha voz.
Acredito que o garoto já achou que eu estava morta, então entrou novamente para ajudar minhas primas a saírem e irem embora.
Não iria conseguir sair dali sem ajuda, definitivamente não, então precisava mostrar que ainda estava viva, de algum jeito, eu tinha que mostrar de algum jeito. Eu respirei o mais fundo que meu soluço de desespero me permitiu conseguir e me ergui, me arrastando até mais para frente do muro, perto de um ralo imundo, assim o garoto poderia ver que eu me mexi então deduzir que eu estava viva.
A dor quase me matou antes que eu conseguisse chegar onde queria, meu braços espirravam sangue e a dor de cada bala alojada era como se estivessem arrancando partes de minha carne com os dentes afiados de um vampiro.
Eu quase não consegui chegar até o ralo, que era a localização quase a frente da porta da sala, mas assim que o alcancei, encostei no muro branco imaculado, com os braços estendidos de tanta dor e falta de força.
O garoto saiu com minhas primas, ambas olhando o homem morto, com medo de que ainda pudesse reviver. Quando o garoto me viu, foi até mim correndo e se abaixou para olhar pra mim, meus olhos já estavam se revirando, eu sabia que logo iria ficar inconsciente, mas quando o garoto apenas tocou no meu braço e pareceu se afastar, minha mente gritou: não, não vai embora, não me deixa aqui por favor, volta! O desesperado mental fazendo o que minha fala simplesmente não conseguia.

Acordei do desmaio em uma maca de ambulância, ainda com a dor forte, mas um pouco amenizada. Os policiais e os médicos estavam por toda a parte e eu olhei em volta para ver se encontrava alguém. O garoto estava sentado na calçado de cabeça baixa e quando a ergueu e viu meu olhar, sorriu de lado, com um ar de alivio e vitoria. Eu tentei fazer o mesmo mas tenho certeza que não saiu tão bom. E ai entrei na ambulância.

Nunca descobrimos o porque aquele sequestro aconteceu e o motivo dele. Apenas sei que meu pai nunca mais contratou alguém para ajuda-lo em suas finanças e que os tiros não deixaram nenhuma sequela trágica, apenas muitas e muitas cicatrizes em minha pele.
Eu sei que eu matei um homem, eu sei que fui sequestrada, e eu sei que fui fuzilada... mas pareceu que tudo aquilo não chegava perto do sentimento mais triste que já tive quando achei que aquele garoto alto, que me entendeu telepaticamente e que me salvou no final das contas... o sentimento desesperador e desolador de achar que ele fosse me deixar para trás.

- by Elize Blackmore
(inspirado em um sonho recente)

Um comentário:

  1. Nossa. Que sonho!
    Me fez lembrar um pouco Fragmentado (2017)... O ato do sequestro sem qualquer resgate ou contato com familiares... E a questão da personagem calculista e corajosa . Muito bom mesmo 😊

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